sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

O CÚMPLICE E O ASSASSINO - Capítulo 14

14
– É o Pedro, senhor, ele morreu.
            As palavras saíram esganiçadas de sua boca. Juliet e Abeline não aguentaram e puseram-se a chorar. Não conseguiam imaginar a cena. Pedro, o velho motorista, que August tanto gostava, estava morto.
            Após várias lágrimas rolarem, Abeline conseguiu relatar o fato por completo.
            – Uma carreta o pegou. Estava indo para o sítio que ele tinha ali na cidade vizinha. Sempre ia pra lá, nos seus dias de folga. Encontraram o carro e o corpo naquela curva que ele tanto falava, lembram-se?
            Como esquecer? Pedro, toda vez que ia ao seu sítio, comentava sobre aquela curva. “Todos os caminhoneiros têm medo daquele trecho, pois é uma curva fechada demais. Eu, quando passo ali, tomo todo cuidado do mundo”, dizia ele.
            August não disse nada. Parecia petrificado. Somente em seus olhos era possível ver o seu desespero e a dor de perder seu motorista amigo.
            A monotonia de sempre se dissipou pela casa. August interrogava-se: “Que tempos são esses”?  Todos estavam abalados, principalmente Juliet, pois a palavra morte fazia lembrar-se de seus pais. Ainda mais associada a carro, estrada. Isso dava arrepios na garota.

            O enterro de Pedro não foi demorado, porém houve tempo suficiente para muitas lágrimas fugirem dos olhos das pessoas. A maioria era parente. August era o que estava mais próximo do caixão, ao lado de Abeline, sua fonte de força. A sua visão falhou por um momento, podia jurar que ficara cego, pois um formigamento o atacou. Por breves segundos ele viu a si próprio no caixão. Imóvel. Gelado. Morto. Uma gota de suor desceu por sua testa enrugada. Era fria. A última coisa que ele sentiu foi um aperto no braço, dado por sua empregada e logo após desabou.
            August fora levado para o hospital, não era nada, simplesmente desmaiara. A sensação de perder um amigo e de se ver no caixão era muito ruim. Sua pressão baixou e logo ocorreu o desmaio.
            Abeline e Juliet estavam ao seu lado quando acordou. – O que houve comigo? – perguntou ele, abobalhado.
– Você desmaiou tio, poupe esforços. Já, já, estaremos indo para casa.
            O velho concordou. Imagens do enterro passavam por sua mente. Ele via Pedro ainda vivo e de repente, ele estava morto. Era ruim, mas August imaginava. Queria voltar logo para casa.
            Duas horas mais tarde eles já estavam na mansão. Silenciosa. Vácua. Ninguém tecia um comentário. Os empregados chegavam do enterro aos poucos. Os olhos marejados, vermelhos, cheios de dor. A tristeza pairou.

            No dia seguinte, tinham que contratar outro motorista, August não poderia ficar sem um, pois estava muito velho para dirigir.
            Um dos ajudantes de cozinha falou com Juliet, sobre um amigo que precisava de emprego. – Ele sabe dirigir muito bem – dizia.
            – Está bem, poderia pedir-lhe para falar comigo, essa tarde?
            – Mas é claro! – exclamou o homem.
Juliet não gostou de sua expressão. Parecia alegre, ela sentiu como se o empregado estivesse desrespeitando Pedro. “Não, acho que não”, pensou a moça logo em seguida. “Ele deve estar contente por quase garantir um emprego para o amigo”.
            Juliet gostou do homem, ou melhor, do rapaz que fora fazer uma entrevista com ela.
            – Você é muito jovem – disse ela ao moço. – Sabe dirigir bem, mesmo?
            – Sim – respondeu Alex, sorrindo.
            – É que precisamos de alguém de confiança, me entende Alex?
            – Está falando com a pessoa certa.
            – Senti que você é bem seguro. Vamos falar com o meu tio – disse Juliet.
            Os dois se levantaram e saíram do escritório de August. Juliet o levara agora para o quarto de seu tio. E logo, quando entrou, foi avisando:
            – Titio, já está escolhido o seu novo motorista.
            Ele a olhou, com aqueles olhos ainda tristes, e sem muita emoção respondeu. – Ótimo.
            – Esse é o Alex tio – e virando-se para o rapaz, disse: – e é para esse senhor que você irá trabalhar, Alex.
            – Nossa, desculpe-me a empolgação, mas é um prazer imenso conhecer o senhor, sabia?
            Ninguém falou nada. August não estava bem, mas, deu as boas-vindas para o seu mais novo contratado. Alex foi embora uns quinze minutos depois e Juliet pediu para Abeline providenciar seu uniforme. Começaria amanhã. O rapaz foi embora com cara de “esse emprego caiu do céu”.
            Fabiano foi visitar seu amigo, para dar-lhe algum apoio. Ele e August ficaram conversando por um bom tempo.
            A tarde foi cedendo lugar para a noite, que chegou vagarosa. A monotonia parecia uma cúpula que envolvia a mansão.

            Na manhã seguinte, August reuniu todos os empregados no grande salão. Tivera um pesadelo de noite e tomou uma decisão. No sonho, via-se no lugar de Pedro, novamente. “Já estou quase lá”, pensou ele, referindo-se à sua morte.
            Todos estavam a postos quando ele desceu as escadas, até mesmo Alex. Nenhum deles sabia o que estava acontecendo, nem mesmo Abeline e Juliet. O velho parou no meio do arco que se formava. E começou a falar:
            – Nem sei por onde começar, mas vou dizer. Ontem estive pensando numa coisa que eu fiz. Um testamento. E decidi contar-lhes, pois vocês serão beneficiados também e achei que deveriam saber.
            Pequenos murmúrios surgiram, mas cessaram logo, dando espaço para as palavras de August.
            – Vou ler um rascunho que fiz do testamento. Existe um original e nele constam os mesmos valores que estão aqui neste papel.
            Depois de um breve silêncio ele declarou:
            – A Metal Industrial seria de minha falecida irmã, Isadora, mas como isso não é possível, automaticamente, a dona da fábrica será Juliet, minha sobrinha. Para a minha outra irmã, Valéria, deixarei esta mansão, vamos ver se assim ela vem para cá – disse ele com um risinho. – Mas não é só isso, Valéria ficará com vinte por cento dos lucros da empresa. Na realidade, as duas, Valéria e Juliet, serão sócias. – Fez-se uma pausa, ninguém falou nada, logo August prosseguiu. – Quase lutei com Abeline para beneficiá-la, ela disse que não aceitaria e blá, blá, blá, mas eu não a escutei, por isso continuei com a idéia de deixar certa quantia do dinheiro que há em minha conta poupança para ela. Não sei se devo dizer, não sei se ela me permite falar o valor.
            August olhou para Abeline, que envergonhada, assentiu.
            – Pois bem, meus caros, Abeline receberá cinquenta por cento do valor que eu tenho na minha conta. – Houve pequenos murmúrios, alguns de admiração. Abeline corou. – Bem, e os outros cinquenta por cento que ainda restaram, serão divididos entre todos vocês, meus empregados, e para meu amigo Fabiano. Creio que ele não precise, pois já está muito bem em relação ao dinheiro, mas é só uma forma de retribuir sua amizade. Fabiano não está aqui conosco, depois eu ligo e o aviso.
E agora, agradeço a todos, espero que eu tenha feito uma divisão correta e que este dinheiro sirva para ajudá-los em algo. Quero que o utilizem de forma correta, certo?
            Uma onda sonora de respostas positivas encheu a grande sala. Cada um foi se retirando contente por fazer parte do testamento. – Imagina quanto é que não dá pelo menos um por cento do dinheiro dele? – perguntavam-se.
            Na manhã seguinte, os empregados pareciam bem mais dispostos e mais contentes, vários comentários passavam pela cozinha, vagando junto com o aroma do almoço. No resto da casa o clima foi mais normal. Juliet já sabia que herdaria a Metal Industrial, pois o seu tio já falara isso para ela e para Abeline isso já não era surpresa, pois sabia do testamento há muitos anos.
            A tarde não passou tão rápida quanto o período da manhã, entretanto, August já se sentia melhor. Chamou Alex para levá-lo até sua empresa, para ver como é que andavam os negócios.

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